Objetos híbridos: leitura crítica dos romances Mil Rosas Roubadas (2014) e Machado (2016), de Silviano Santiago
Webinário
22 de fevereiro
10h–11h
via Google Meet
Introdução: contextualização do trabalho de Silviano Santiago (Formiga, Minas Gerais, 1936) a partir da leitura do poema “Esses textos”, uma glosa ao final de Crescendo durante a guerra numa província ultramarina (publicado originalmente em 1978), e do ensaio “O entre-lugar do discurso latino-americano”, primeiro texto de Uma literatura nos trópicos (também publicado originalmente em 1978). Santiago e os deslocamentos: Brasil–França–Estados Unidos–Brasil. A ficção e a História Social: o caso dos livros Em Liberdade e Stella Manhattan, publicados originalmente na década de 1980. A genialidade não original e uma ideia de negatividade: escrever contra o próprio tempo.
Tópicos para discussão:
1. A estratégia substancial de Silviano Santiago: para iniciar a conversa, é preciso ter em mente que esses romances são indomesticáveis. Quer dizer, por mais que nos esforcemos em assimilá-los, o irreconhecível é parte das obras. Isso acontece porque o autor, embaralhando gêneros, chega a zonas em que dispositivos críticos podem obstruir a leitura. Ainda assim, importa-nos a leitura atenta, para reconhecer que, por exemplo, o tom ensaístico faz com que os romances produzam linguagem. Por si só, o ensaio promove um deslocamento, uma vez que especular é a tarefa do ensaísta. Do mesmo modo, o romance é uma moldura do desvio, da peregrinação: à procura de autoconhecimento, o herói de um romance — que, em nosso caso, é autor e narrador — peregrina em direção a si mesmo. Quem escreve-os — tanto os ensaios quanto os romances —, não busca nada senão uma deriva. Resta-nos dar ênfase a um problema: colocar ensaio e romance na mesma operação causa hipertrofia?
2. Uma bifurcação: em Mil Rosas Roubadas, o narrador peregrina em busca de um mito de origem pessoal, que é o primeiro encontro com o amigo pelo qual foi apaixonado e, anos depois, viu no leito de morte; em Machado, o narrador peregrina em busca de mitos coletivos para reconstituir os últimos anos de vida de Machado de Assis e meditar sobre o ato ficcional. Uma obra lida diretamente com a memória vivida e a outra, com memória lida, mas esses tipos não se excluem. Nelas, o tempo é não linear e o espaço geográfico, sem dúvidas, circunscrito. Outro elemento comum entre os textos é a destruição passageira da opacidade por meio da apropriação de outros textos — até que se tornem, mais uma vez, opacos. A obra ficcional de Silviano Santiago trabalha como uma ponte estaiada, isto é, uma estrutura intermediária, nem fixa, nem suspensa. Noutras palavras, um entrelugar que impõe a seguinte questão: Mil Rosas Roubadas e Machado, publicados na última década, representam uma linguagem das nossas crises — a econômica, a política e a social? É a transitoriedade a linguagem da crise?
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Referências bibliográficas
SANTIAGO, Silviano. Crescendo durante a guerra numa província ultramarina. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.
____, ____. Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
____, ____. Mil rosas roubadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.
____, ____. Uma literatura nos trópicos. Recife: Editora Cepe, 2019.
Referências complementares
AIRA, César. Pequeno Manual de Procedimentos. Curitiba: Editora Arte e Letra, 2007.
____, ____. Sobre a arte contemporânea. Rio de Janeiro: Zazie Edições, 2018.
AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó, SC: Editora Argos, 2009.
KLEIN, Kelvin Falcão. Cenas de leitura em Silviano Santiago. Estud. Lit. Bras. Contemp., Brasília , n. 57, e572, 2019 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2316-40182019000200300&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 6 de out. de 2020. Epub 20-Maio-2019. https://doi.org/10.1590/2316-40185714.
Lopes, Silvina Rodrigues. A anomalia poética. Belo Horizonte: Chão da Feira, 2019.
LUKÁCS, Georg. A teoria do romance. São Paulo: Duas Cidades: Editora 34, 2000.
PERLOFF, Marjorie. O gênio não original. Belo Horizonte: EDITORA UFMG, 2013.
SANTIAGO, Silviano. 35 ensaios de Silviano Santiago. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
____, ____. Em Liberdade. Rio de Janeiro: Rocco, 1994.
____, ____. Stella Manhattan. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.